
Vivemos tempos em que o simples ato de questionar virou motivo de censura. Em que a dúvida honesta é tachada de negacionismo, e a prudência científica, de neglicência. Não é à toa que o nome do novo comissário da FDA, Dr. Marty Makary, já está circulando com força nos corredores do poder — e gerando calafrios nos que se acostumaram com uma burocracia inchada e obediente aos ventos políticos. A matéria de Cheryl Clark, publicada no último dia 22 de maio no MedPage Today, mostra com riqueza de detalhes um momento emblemático no Senado norte-americano. Uma audiência em que a ciência, pela primeira vez em muito tempo, foi defendida com coragem — mesmo que isso custasse o conforto ideológico de certos senadores democratas.
Makary, que assumiu o comando da agência há apenas sete semanas, enfrentou um verdadeiro tribunal político — um “julgamento técnico” disfarçado de audiência orçamentária — para responder por decisões que, segundo os críticos, colocariam em risco a “missão” da FDA. Mas afinal, que missão seria essa? Zelar pela saúde pública com base em dados sólidos e transparentes ou manter o status quo de um aparato inchado, ideologizado e sem compromisso com a verdade científica?
A grande polêmica da audiência girou em torno de dois pontos: os cortes nos quadros da FDA e a decisão de restringir os reforços da vacina da COVID-19 apenas para pessoas com mais de 65 anos ou em situação de alto risco. Para senadores como Jeanne Shaheen (D-N.H.), isso equivaleria a “tirar das pessoas o direito de escolha”. O curioso é que, até bem pouco tempo atrás, os mesmos parlamentares não demonstravam nenhum incômodo com a imposição de vacinas obrigatórias, passaportes sanitários ou lockdowns arbitrários. Agora, de repente, redescobriram o valor da liberdade individual?
Makary respondeu com precisão cirúrgica: “Já se passaram quatro ou cinco anos desde o último ensaio clínico randomizado. Não sabemos o número ideal de reforços que um americano saudável deve tomar”. E completou com uma pergunta desconcertante, daquelas que expõem o absurdo: “Vamos mesmo dar 80 doses de mRNA para uma garota saudável ao longo de 80 anos de vida? Isso é mesmo uma estratégia baseada em evidências?”. Com isso, ele fez o que há muito tempo nenhum funcionário de alto escalão do governo ousava fazer: questionar a lógica por trás da obsessão vacinal, sem ser imediatamente cancelado pela patrulha do politicamente correto.
A senadora Shaheen insistiu em saber quando haveria novos dados clínicos. Mas, curiosamente, não parecia preocupada com o vácuo de evidências que sustentaram a política anterior de reforços intermináveis. O que parece incomodar, na verdade, é a disposição do novo chefe da FDA em tratar a ciência com honestidade, ainda que isso represente rupturas com a narrativa que serviu de escudo para abusos nos últimos anos.
Em um trecho ainda mais revelador, Makary se recusou a “carimbar cegamente” vacinas que geram novas proteínas no organismo a cada ano, sem qualquer debate público e sem dados robustos. Como ele mesmo disse: “Vamos fazer isso por 100 anos? Acho que não”. É exatamente esse tipo de lucidez que faltou à FDA durante boa parte da pandemia. E é por isso que tantos preferem manter o país mergulhado no medo e na dependência de soluções mágicas.
Mas as farpas não se limitaram às vacinas. A senadora Shaheen e outros membros do comitê criticaram os cortes de pessoal implementados na agência, mencionando a saída de mais de 4 mil funcionários desde janeiro. A acusação era de que isso colocaria em risco a “estabilidade regulatória” necessária para os fabricantes de medicamentos. Ora, estabilidade é algo desejável — desde que não signifique acomodação, desperdício e aparelhamento.
Makary foi taxativo: os cortes atingiram setores administrativos, como RH, contratos e orçamentos. Segundo ele, foram 2.600 funcionários nessas áreas e outros 1.200 que optaram por aposentadoria antecipada. E fez questão de frisar: “Não houve corte de revisores científicos”. Ao contrário, a FDA está contratando novos cientistas. Talvez o verdadeiro problema seja que, até agora, havia 380 profissionais apenas para comunicação — o que explica por que a FDA parecia mais um departamento de marketing do que uma agência científica.
Em outro momento memorável, ao responder às críticas sobre a substituição do Dr. Peter Marks por Vinay Prasad, Makary desmontou mais um mito: o da insubstituibilidade. Disse que Prasad é um “gênio científico”, com mais de 540 artigos revisados por pares publicados. E foi além: “Rejeito a ideia de que só exista um cientista no mundo capaz de liderar o CBER (Centro de Biológicos)”. Uma frase que deveria ecoar em todos os corredores de Brasília — onde, há décadas, a troca de cargos técnicos se tornou uma dança de cadeiras de conveniência política.
Os senadores, no entanto, não estavam prontos para lidar com um comissário com ideias próprias. Quando Makary explicou que a FDA está mudando o modelo de inspeções programadas para inspeções surpresa, para evitar manipulações de última hora por parte das empresas, esperava-se aplausos. Afinal, quem pode ser contra fiscalização real? Mas o silêncio foi ensurdecedor. Fica claro que a preocupação não é com eficiência, mas com controle.
O mesmo se aplica à reação diante da iniciativa de confiscar quase dois milhões de produtos ilegais de vaporização vindos da China. Em vez de celebração por uma medida concreta contra o vício entre jovens, os senadores se calaram — como se preferissem manter o foco na “perda de estabilidade institucional” da FDA. Em outras palavras, é mais importante manter cargos e estruturas burocráticas do que proteger crianças da dependência química.
Com relação ao orçamento, Makary defendeu o plano da administração Trump, que prevê US$ 6,8 bilhões, sendo US$ 3,2 bilhões de autoridade orçamentária e US$ 3,6 bilhões em taxas pagas por fabricantes à FDA. Isso incomodou ainda mais os democratas, que parecem preferir um Estado inchado financiado pelo contribuinte do que um modelo em que as empresas pagam por seus próprios processos regulatórios. A ironia é que os mesmos políticos que defendem “responsabilidade social corporativa” não querem que as empresas arquem com os custos de seus próprios pedidos de aprovação.
Ao final da audiência, ficou uma impressão clara: o novo chefe da FDA está incomodando as pessoas certas. Makary representa uma ruptura com a cultura da submissão institucional, da obediência acrítica e da burocracia autorreferente. Ele trouxe de volta o debate público, a prudência científica e a gestão baseada em resultados — não em símbolos.
A verdadeira pergunta que paira no ar é: por que isso incomoda tanto?
Por que é escandaloso limitar vacinas a quem realmente precisa, mas não era escandaloso obrigar adultos saudáveis e crianças a receberem múltiplas doses sem evidência clara de benefício?
Por que é “irresponsável” cortar cargos redundantes, mas não era irresponsável manter centenas de coordenadores de viagens e escritórios de estratégia em uma agência que deveria focar em ciência?
Por que é motivo de preocupação exigir novos ensaios clínicos para autorizar reforços, mas não era preocupante autorizar vacinas em massa com base em estudos observacionais apressados?
Essas são as perguntas que Makary teve a coragem de levantar. E é por isso que ele já é alvo de uma campanha sutil, mas persistente, de desqualificação. Afinal, em um mundo onde a obediência se tornou virtude, pensar virou crime.
A audiência no Senado norte-americano foi um divisor de águas. Pela primeira vez em anos, a ciência foi defendida não como dogma, mas como processo. A autoridade foi exercida com responsabilidade, e a liderança demonstrada com coragem.
Se o Brasil tivesse mais líderes assim, talvez já estivéssemos livres da tirania sanitária e do pânico institucionalizado.
Com informações MedPageToday